quarta-feira, julho 30, 2014

Pão

Pablo Neruda
Pão, com farinha, água e fogo te levantas.

Espesso e leve, reclinado e redondo, repetes o ventre da mãe, equinocial germinação terrestre.

Pão, que fácil e que profundo tu és no tabuleiro branco da padaria estendem-se as tuas filas como utensílios, pratos ou papéis, e de súbito a onda da vida, a conjunção do germe e do fogo, cresces, cresces de súbito como cintura, boca, seios, colinas da terra,  vidas, sobe o calor, inunda-te a plenitude, o vento da fecundidade, e então imobiliza-se a tua cor de ouro, e quando já estão prenhes os teus pequenos ventres a cicatriz escura deixou sinal de fogo em todo o teu doirado sistema de hemisférios.

Agora, intacto, és ação de homem, milagre repetido, vontade da vida.

Ó pão de cada boca não te imploraremos, nós, os homens, não somos mendigos de vagos deuses ou de anjos obscuros: do mar e da terra faremos pão, plantaremos de trigo a terra e os planetas, o pão de cada boca de cada homem, em cada dia chegará porque fomos semeá-lo e fazê-lo, não para um homem, mas para todos, o pão, o pão para todos os povos e com ele o que possui forma e sabor de pão repartiremos: a terra, a beleza, o amor, tudo isso tem sabor de pão, forma de pão, germinação de farinha, tudo nasceu para ser compartilhado, para ser entregue, para se multiplicar.

Por isso, Pão, se foges da casa do homem, se te escondem, se te negam, se o avarento te prostitui, se o rico te armazena, se o trigo não procura sulco e terra, pão, não rezaremos pão, não mendigaremos, lutaremos por ti com outros homens, com todos os famintos, por todos os rios, pelo ar iremos procurar-te, a terra toda repartiremos para que tu germines, e conosco avançará a terra: a água, o fogo, o homem lutarão junto a nós.

Iremos coroados de espigas, conquistando terra e pão para todos, e então também a vida terá forma de pão, será simples e profunda, inumerável e pura.

Todos os seres terão direito à terra e à vida, e assim será o pão de amanhã, o pão de cada boca, sagrado, consagrado, porque será o produto da mais longa e dura luta humana.

Não tem asas a vitória terrestre: tem pão sobre os seus ombros, e voa corajosa libertando a terra como uma padeira levada pelo vento.

Nenhum comentário: