sábado, julho 25, 2015

Eu hoje tive um pesadelo
E levantei atento, a tempo
Eu acordei com medo
E procurei no escuro
Alguém com o seu carinho
E lembrei de um tempo

Porque o passado me traz uma lembrança
Do tempo que eu era criança
E o medo era motivo de choro
Desculpa pra um abraço ou um consolo

Hoje eu acordei com medo
Mas não chorei, nem reclamei abrigo
Do escuro, eu via o infinito
Sem presente, passado ou futuro
Senti um abraço forte, já não era medo
Era uma coisa sua que ficou em mim
E que não tem fim

De repente, a gente vê que perdeu
Ou está perdendo alguma coisa
Morna e ingênua que vai ficando no caminho
Que é escuro e frio, mas também bonito porque é iluminado
Pela beleza do que aconteceu há minutos atrás

Cazuza

sexta-feira, julho 24, 2015

quinta-feira, julho 23, 2015

A poesia está guardada nas palavras - é tudo que
eu sei.
Meu fado é o de não entender quase tudo.
Sobre o nada eu tenho profundidades.
Não cultivo conexões com o real.
Para mim, poderoso não é aquele que descobre ouro,
Poderoso para mim é aquele que descobre as insignificâncias
do mundo e nossas.
Por essa pequena sentença me elogiaram de imbecil.
Fiquei muito emocionado e chorei.
Sou fraco para elogios.

Manoel de Barros

quarta-feira, julho 22, 2015


Quero lhe implorar
Para que seja paciente
Com tudo o que não está resolvido em seu coração e tente amar.
As perguntas como quartos trancados e como livros escritos em língua estrangeira.
Não procure respostas que não podem ser dadas porque não seria capaz de vivê-las. E a questão é viver tudo. Viva as perguntas agora.
Talvez assim, gradualmente, você sem perceber, viverá a resposta num dia distante.
Rainer Maria Rilke

terça-feira, julho 21, 2015

Toda vez que um justo grita
um carrasco o vem calar
quem não presta fica vivo
quem é bom, mandam matar
quem não presta fica vivo
quem é bom, mandam matar

foi trabalhar para todos
e vede o que lhe acontece
daqueles a quem servia
já nenhum mais o conhece
quando a desgraça é profunda
que amigo se compadece?

Foi trabalhar para todos
mas, por ele, quem trabalha?
Tombado fica seu corpo
nessa esquisita batalha
suas ações e seu nome
por onde a glória os espalha?

Por aqui passava um homem
(e como o povo se ria!)
Que reformava este mundo
de cima da montaria
por aqui passava um homem
(e como o povo se ria!)
Ele na frente falava
e atrás a sorte corria

por aqui passava um homem
(e como o povo se ria!)
Liberdade ainda que tarde
nos prometia

Cecília Benevides de Carvalho Meireles

segunda-feira, julho 20, 2015

Timidez
Basta-me um pequeno gesto,
feito de longe e de leve,
para que venhas comigo
e eu para sempre te leve…
- mas só esse eu não farei.
Uma palavra caída
das montanhas dos instantes
desmancha todos os mares
e une as terras mais distantes…
- palavra que não direi.
Para que tu me adivinhes,
entre os ventos taciturnos,
apago meus pensamentos,
ponho vestidos noturnos,
- que amargamente inventei.
E, enquanto não me descobres,
os mundos vão navegando
nos ares certos do tempo,
até não se sabe quando…
e um dia me acabarei.
 Cecília Meireles

domingo, julho 19, 2015

Motivo
Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.
Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.
Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.
Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
- mais nada.
 Cecília Meireles