sábado, março 05, 2016

Meus cachos.
Eu pinto meu cabelo,
para cobrir o branco deixado pelo tempo,
Eu pinto meu cabelo,
para esquecer as marcas deixadas pelo trabalho,
Eu pinto meu cabelo,
para deixar meus cachos mais atraentes,
Eu pinto meu cabelo,
para deixar minha cor mais reluzente,
Eu pinto meu cabelo,
para esquecer o sofrimento na senzala,
Meus cabelos estão brancos
de tanta preocupação
que tive em quanto estava na senzala;
mas, isso não vai prejudicar meus cachos,
Eu pinto meu cabelo.

Charles Dalan Jesus dos Santos

sexta-feira, março 04, 2016

Para que serve o poeta?

O dono de um pequeno comércio, amigo do grande poeta Olavo Bilac, abordou-o certa vez na rua: 

- Sr. Bilac, estou a precisar vender a minha propriedade, que o Senhor tão bem conhece. Poderia, por gentileza, redigir o anúncio para a venda no jornal? 

Olavo Bilac apanhou o papel que o amigo lhe estendia e escreveu:

VENDE-SE ENCANTADORA PROPRIEDADE

"Vende-se encantadora propriedade, onde cantam os pássaros ao amanhecer no extenso arvoredo. Cortada por cristalinas e marejantes água de um ribeiro. A casa, banhada pelo sol nascente, oferece a sombra tranqüila das tardes, na varanda".

“Meses depois, o poeta reencontrou o comerciante e perguntou-lhe se havia conseguido vender a propriedade”.

- Nem pense mais nisso Sr. Bilac! Quando li o anúncio que o senhor escreveu é que percebi a maravilha que tinha nas mãos. 


quinta-feira, março 03, 2016

Outono

O outono vem vindo, chegam melancolias, 
cavam fundo no corpo, 
instalam-se nas fendas; às vezes 
por aí ficam com a chuva 
apodrecendo; 
ou então deixam marcas; as duras, 
difíceis de apagar, de tão negras duras. 

Eugénio de Andrade(adaptado)

quarta-feira, março 02, 2016

O homem já aprendeu as dores e sofrimentos de uma guerra, mas parece que já esqueceu.

terça-feira, março 01, 2016

Chove. Há Silêncio

Chove. Há silêncio, porque a mesma chuva 
Não faz ruído senão com sossego. 
Chove. O céu dorme. Quando a alma é viúva 
Do que não sabe, o sentimento é cego. 
Chove. Meu ser (quem sou) renego... 

Tão calma é a chuva que se solta no ar 
(Nem parece de nuvens) que parece 
Que não é chuva, mas um sussurrar 
Que de si mesmo, ao sussurrar, se esquece. 
Chove. Nada apetece... 

Não paira vento, não há céu que eu sinta. 
Chove longínqua e indistintamente, 
Como uma coisa certa que nos minta, 
Como um grande desejo que nos mente. 
Chove. Nada em mim sente... 

Fernando Pessoa

segunda-feira, fevereiro 29, 2016

Bilhete

Se tu me amas, ama-me baixinho
Não o grites de cima dos telhados
Deixa em paz os passarinhos
Deixa em paz a mim!
Se me queres,
enfim,
tem de ser bem devagarinho, Amada,
que a vida é breve, e o amor mais breve ainda...
Mario Quintana

domingo, fevereiro 28, 2016

Tomara

Que a tristeza te convença
Que a saudade não compensa
E que a ausência não dá paz
E o verdadeiro amor de quem se ama
Tece a mesma antiga trama
Que não se desfaz

E a coisa mais divina
Que há no mundo
É viver cada segundo
Como nunca mais...

Vinicius de Moraes