sábado, setembro 20, 2014

Erros Programados
Uma linguagem que corte o fôlego. Rasante, talhante, cortante. Essa deve ser a linguagem do poeta.

Linguagem de aços exatos, de relâmpagos afiados, de agudos incansáveis, de navalhas reluzentes.
Uma dentadura que triture o eu-tu-ele-nós-vós-eles.
Um vento de punhais que desonre as famílias, os templos, as bibliotecas, os cárceres, os bordéis, os colégios, os manicômios, as fábricas, as academias, os cartórios, as delegacias, os bancos, as amizades, as tabernas, a revolução, a caridade, a justiça, as crenças, os erros, a esperança, as verdades... a verdade!

 Octavio Paz

sexta-feira, setembro 19, 2014


A Vida e a Arte

Quando eu era jovem, eu pensava que com a arte seria possível mudar o mundo.
Eu buscava constantemente um espetáculo que pudesse despertar no coração do público uma esperança.
Eu queria mostrar uma maneira diferente de viver, com mais amizade, criatividade, sem a obrigação de perseguir o dinheiro e o poder. Ilusão fútil que eu nunca consegui alcançar. Não só a revolução não chegou, como as pessoas se tornaram cada vez mais loucas e materialistas.
Quando eu me dei conta disto eu vivi momentos difíceis pensando, pensando inclusive que minha vida era um fracasso e que todo esforço era inútil.
Mas um dia eu tive uma revelação: se não se pode mudar o mundo, pelo menos é possível mudar a si mesmo, encontrar algo em seu coração, um desejo, uma necessidade e entregar-se totalmente a ele, sem olhar para trás. Isso não é para a sociedade ou para os outros, não, é para você mesmo.
E eu fazendo esse palhaço que eu sou, eu encontrei essa coisa. Provocar, burlar e fazer o público rir. Isso era tudo o que eu buscava em minha vida. Por certo eu não mudava o mundo, mas os palhaços nunca mudaram o mundo, passam o tempo tentando sem nunca conseguir, por isso são palhaços.
Os palhaços gostam do fracasso e das ações ineficazes, são perdedores alegres e isto é a verdadeira força que têm, nunca se cansam de perder. Desfrutam de cada fracasso e voltam em seguida a fracassar de novo, diluindo assim as certezas das pessoas sérias e que nunca duvidam.
Então, esse sangue que pareço ter na minha cabeça, esse sangue que tenho sobre a minha camisa, esse sangue que tenho no meu coração, esse sangue que está todo em mim é tão patético e inútil em seu simbolismo porque é sangue de um palhaço. Um sangue que não vem de uma grande luta ou em nome de uma causa heroica. É sangue de brincadeira, ao mesmo tempo verdadeiro e pouco importante.

quinta-feira, setembro 18, 2014

Uma palavra possível.
Mergulhar a palavra suja em água sanitária. Depois de dois dias de molho, quarar ao sol do meio dia.
Algumas palavras quando alvejadas ao sol adquirem consistência de certeza. Por exemplo, a palavra vida.
Existem outras - e a palavra amor é uma delas - que são muito encardidas pelo uso, o que recomenda esfregar e bater insistentemente na pedra, depois enxaguar em água corrente. São poucas as que resistem a esses cuidados, mas existem aquelas.
Dizem que limão e sal tiram sujeira difícil, mas nada. Toda tentativa de lavar a piedade foi sempre em vão. Agora nunca vi palavra tão suja como perda. Perda e morte, na medida em que são alvejadas, soltam um líquido corrosivo, que atende pelo nome de amargura, que é capaz de esvaziar o vigor da língua. O aconselhado nesse caso é mantê-las sempre de molho em um amaciante de boa qualidade. Agora, se o que você quer é somente aliviar as palavras do uso diário, pode usar simplesmente sabão em pó e máquina de lavar. O perigo neste caso é misturar palavras que mancham no contato umas com as outras. Culpa, por exemplo. A culpa mancha tudo que encontra e deve ser sempre alvejada sozinha.outra mistura pouco aconselhada é amizade e desejo, já que desejo, sendo uma palavra intensa, quase agressiva, pode, o que não é inevitável, esgarçar a força delicada da palavra amizade. Já a palavra força cai bem em qualquer mistura.outro cuidado importante é não lavar demais as palavras. Sob o risco de perderem o sentido. A sujeirinha cotidiana, quando não é excessiva, produz uma oleosidade que dá vigor aos sons. Muito importante na arte de lavar palavras é saber reconhecer uma palavra limpa. Conviva com a palavra durante alguns dias. Deixe que se misture em seus gestos, que passeie pela expressão dos seus sentidos. À noite, permita que se deite, não a seu lado mas sobre seu corpo. Enquanto você dorme, a palavra, plantada em sua carne, prolifera em toda sua possibilidade. Se puder suportar essa convivência até não mais perceber a presença dela, então você tem uma palavra limpa.
Uma palavra limpa é uma palavra possível.
Viviane Mosé

quarta-feira, setembro 17, 2014

Nem tudo é o que parece...tenha foco.

O mistério.

O mistério das coisas, onde está ele? 
Onde está ele que não aparece 
Pelo menos a mostrar-nos que é mistério? 
Que sabe o rio disso e que sabe a árvore? 
E eu, que não sou mais do que eles, que sei eu disso? 
Sempre que olho para as coisas e penso no que os homens pensam delas eu dou risada, 
Rio como um regato que soa fresco numa pedra. 
Porque o único sentido oculto das coisas 
É elas não terem sentido oculto nenhum, 
É mais estranho do que todas as estranhezas 
E do que os sonhos de todos os poetas 
E os pensamentos de todos os filósofos, 
Que as coisas sejam realmente o que parecem ser 
E não haja nada que compreender. 
Sim, eis o que os meus sentidos aprenderam sozinhos: 
As coisas não têm significação: têm existência. 
As coisas são o único sentido oculto das coisas.

Alberto Caeiro

terça-feira, setembro 16, 2014

Agora que a mansão está concluída, os trabalhadores começam a grade.
São barras de ferro com pontas de aço capazes de tirar a vida a quem se arrisque sobre elas.
Uma obra prima que impedirá a entrada de famintos, crianças de rua e vagabundos.
Vagabundos de toda espécie.
Entre as barras e sobre as pontas de aço nada passará exceto a chuva, a morte e o dia de amanhã.
E quando as grades não resolvem? O braço forte da lei e da justiça vem...
Adap: Carl August Sandburg

segunda-feira, setembro 15, 2014


Aos visitantes dos Estados Unidos, obrigado.
José Saramago
O desbarato mais absurdo não é o dos bens de consumo, mas o da humanidade: milhões e milhões de seres humanos nasceram para ser trucidados pela História, milhões e milhões de pessoas que não possuíam mais do que as suas simples vidas. De pouco ela lhes iria servir, mas nunca faltou quem de tais miuçalhas tivesse sabido aproveitar-se. A fraqueza alimenta a força para que a força esmague a fraqueza. 

domingo, setembro 14, 2014

Obrigado pelas visitas
Viva, insisto VIVA!!!!!!

Sonhos de um Mundo melhor.
Compra-se um filme que tenha menos de dez tiros, assassinos e assassinatos. Que tendo cama, tenha também outros móveis agradáveis à vida. A vida comum do corpo, como a preguiçadeira, a mesa, a cadeira. Que tenha princípio, meio e fim. Que não tenha charada nem blá blá blá. Enfim um filme que não exista mas pareça tudo.
Carlos Drummond de Andrade